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quarta-feira, 13 de julho de 2011

Em alta no Brasil, arbitragem ganha clones




A arbitragem começa a pagar o alto preço do sucesso. Consagrado como forma eficaz de resolução de conflitos societários de grande porte por sua agilidade e pela especialização dos profissionais envolvidos, o método está sofrendo um inusitado tipo de concorrência no país.

Trata-se de uma espécie de plágio. Empresas recebem documentos similares a intimações judiciais, convocando-as para supostas audiências arbitrais. Embora emitidos por câmaras de arbitragem, usam linguagem, símbolos e timbres típicos do Poder Judiciário.

O maior estrago que têm causado é a confusão entre os procedimentos arbitrais e os praticados pela Justiça convencional.

Considerada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal em 2001, a arbitragem nada tem a ver com o Judiciário. Ocorre à suamargem, por escolha voluntária das partes. As câmaras são entidades privadas, cobram taxas pelos serviços prestados e não podem usar símbolos, linguagem e estruturas estatais.

Os casos de citações híbridas de arbitragem se espalham pelo país. No entanto, Goiás é, de longe, o estado em que os problemas aparecem em maior escala.

O escritório Demarest&Almeida, por exemplo, registra ao menosdez casosde empresas chamadas para arbitragens dessa forma recentemente. Todas envolviam empreiteiras que comandam obras na região. “Elas são chamadas por fornecedores que cobram dívidas, sendo que não há sequer cláusula dearbitragemfirmadaentre ambos. Os documentos vêm assinados por escrivão e com brasãoda Justiça”, dizRafael Gagliardi, sócio da banca.

Anna Christina Jimenez Pereira, sócia da Duarte Garcia, Caselli Guimarães e Terra Advogados, usa apenas uma palavra para definir o que pensa sobre essas citações: golpe.

“Arbitragem é algo sério, profissional e não pode ser confundida com esse tipo de coisa. De qualquer forma, pessoas que agem de boa fé ficam confusas quando recebem um documento desses. Ficam sem ação.”

A opinião dos advogados é unânime. Ao receber esse tipo de citação, as empresas devem simplesmente ignorá-lo.

Mas não são apenas empresas que têm sido vítimas desse tipo de procedimento. Pessoas físicas que poderiam ingressar emjuizados especiais de pequenas causas para cobrar dívidas de até 40 salários mínimos estariam sendo induzidas erroneamente a acionar arbitragens, acredita Rita de Cássia Serra Negra, do escritório Mesquita Pereira Marcelino, Almeida, Esteves Advogados.

“Não sabemos como essas câmaras abordam as pessoas. Elas precisam ser alertadas, pois têm o Judiciário para buscar seus direitos gratuitamente. A arbitragem tem custos e é inócua para situações como essa”, alerta a advogada.

Rita comenta ter atendido pelo menosumcliente citadoemarbitragem nesse modelo de “parceria público-privada”.Ofato aconteceu no interior de São Paulo. Câmaras arbitrais sem regulamentos claros e que tentam intimidar as partes também já foram identificados em outras partes do país. “Em Natal, uma delas queria cobrar taxas para passar informações sobre seu funcionamento. Outras querem impor árbitros”, afirma Pedro Verona Maciel, sócio do Veirano.

Câmaras que usam esse tipo de expediente apostam no desconhecimento de pessoas físicas.Por isso écomumque muitos dos casos envolvam valores baixos e cobranças que não deveriam parar na arbitragem, comenta José Maria Meirelles, presidente da Comissão de Mediação e Arbitragem da seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil.

“Câmaras que usam a balancinha do Judiciário, dizem ter oficiais de Justiça e intimam as partes são um desvio completo da arbitragem. Uma aberração que nos faz pensar que vivemos uma depuração na arbitragem”.

Meirelles já teve sob sua mesa pelo menos cinco casos com essas características.

Histórico obscuro
No final de junho, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) derrubou decreto do Tribunal de Justiça (TJ) de Goiás que permitia a instituição de parcerias públicoprivadas com cortes de conciliação e arbitragem naquele estado e convênios que possibilitaram a instalação de cinco cortes arbitrais na região.

“Pesquisas constataram mais de dez irregularidades nas câmaras do estado. Havia árbitros julgando casos imobiliários sendo donos de empreendimentos. É um clássico conflito de interesses”, critica Selma Lemes, professora de arbitragem da Fundação Getulio Vargas

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